POEMA DE JOSE JORGE LETRIA PARA EUSÉBIO
Rei que eras, partiste na véspera
do dia de todos os reis,
já sem esplendor na relva,
em trono de magoada saudade,
com essa coroa de lágrimas
que faz brilhar o rosto
de quem tantas vezes nos fez felizes.
Ficam em silêncio as estrelas
e as sirenes dos barcos e das fábricas.
Tudo se cala para, com vénia, te dizer adeus.
E eu o que direi agora aos filhos e aos netos
depois de tantas vezes te ter chamado
sinónimo de glória, nos instantes em que o golo
era a conquista maior de um génio
de voo tão largo como o das águias ?
Há um Portugal triste que hoje se ergue
para te dizer que vela pela tua memória,
pelo teu lugar no panteão dos deuses terrenos,
pelo fulgor da tua imagem iluminando os estádios.
Até na morte nos engrandeces, Eusébio,
nosso irmão universal, quando olhas para o fundo das redes
e dizes: “Eu juro que havemos de vencer,
em Wembley ou onde quer que seja !”
Curva-se o mundo, que é muito mais que a cobiça dos mercados,
ante o teu nome trabalhado a ouro
nas colunas largas do arco de todos os triunfos.
E quantas vezes a abnegação te doeu e te fez chorar,
e quantas vezes Portugal chorou contigo
por achar que merecia mais do que o destino lhe queria dar,
e quantas vezes tu choraste baixinho
por não nos quereres privar da alegria de vencer,
e quantas vezes eu chorei no ombro do meu pai
por sentir que ninguém tinha o direito de ferir as tuas asas ?
Nós estávamos lá, no estádio, e sofríamos contigo,
amor antigo que o tempo não deixou prescrever.
Vai agora em paz, Eusébio, que a Luz
ergue-se brava e estóica para te deixar partir,
embora te guarde para sempre no cofre
de um coração sofrido. Vai em paz, Eusébio,
que nós sabemos que tu moras onde mora a Luz,
residência certa dos heróis, das lendas e dos sonhos.
José Jorge Letria
5 de Janeiro de 2014