Tenho a dizer que não sou fã de futebol.
Provavelmente porque o inicio da temporada coincidia com o deixar a "minha casa em Castanheira de Pêra" e rumar a Coimbra para frequentar o liceu.
Recordo-me de ouvir os relatos futobolisticos quando atravessava a serra da Lousã com os meus Pais.
Os golos do Benfica eram saudados pelo meu Pai...por mim, sublinhados com algumas lágrimas que antecipavam a saudade dos "mimos" caseiros.
Tinha acabado de fazer10 anos.
Assisti a um único jogo em toda a minha vida - Academica/Benfica, Jamor 1969 /Taça de Portugal.
Foi a primeira e última vez que vi, in loco, Eusébio jogar.
(Lembro que o carro que me transportou a Lisboa - impediram-me de ir de combóio! - ia dividido ao meio: metade pertencia à ACADÈMICA. A outra metade ao BENFICA.
O meu Pai era benfiquista. Eu e a minha Mãe ... da Académica.
Eu estava a acompanhar a "Briosa" num evento que se desenrolava em plena crise Académica de Coimbra.
Para nós, estudantes, ganhar esta final da taça era muito mais que ver um bom jogo.
Americo Thomaz, Presidente da Républica, ao tempo, já decidira não estar presente no Jamor, não "fora o diabo tecê-las" e ter de entregar a taça aos estudantes, em greve.
Foi substituido pelo General Sá Viana Rebelo.
Posso dizer, e as imagens não me deixam mentir, que o Jamor estava cercado e invadido por polícia. De choque. Muita.
Como hoje já se começa a ver por aí.
A Académica jogou excepcionalmente bem.
Prolongamentos? Dois.
Não ganhámos.
Este jogo, podem crer, fez história para a Académica e estudantes que estiveram presentes no Jamor.)
Foi essa a única vez que vi Eusébio jogar.
Eu não entendia (nem entendo) nada de futebol.
Tenho de dizer, no entanto, que a sua forma de jogar era incrível e concordo TOTALMENTE com os que apelidavam Eusébio de "Pantera Negra" e "King".
Eu que não gostava de futebol...ficava presa ao ecrã...à espera de ver saltos de verdadeira "gazela".
Mais tarde conheci, pessoalmente, Eusébio.
Num restaurante em que almoçava com o meu Pai ...que nunca entendeu eu não gostar de futebol e, muito menos, não ser benfiquista..
Como jornalista, reencontrei Eusébio em eventos vários.
Os últimos na Marina Cruz, uma amiga comum.
Muitas vezes a ouvi falar dele.
De valores de Amizade e verdadeira solidariedade.
De momentos bons e menos bons.
Fui acompanhando, como quase todos os portugueses, a sua vida.
Encontrava amiúde Flora, a sua mulher.
Aprendi a respeitá-lo.
Pela sua universalidade, a sua forma "rara" de entender o desporto.
A sua forma de "ser".
Por isso, associo-me ao "sentir nacional" lembrando um poema que Manuel Alegre lhe dedicou:
"Havia nele a máxima tensão
Como um clássico ordenava a própria força
Sabia a contenção e era explosão
Não era só instinto era ciência
Magia e teoria já só prática
Havia nele a arte e a inteligência
Do puro e sua matemática
Buscava o golo mais que golo-
só palavra
Abstracção
ponto no espaço
teorema
Despido do supérfluo rematava
E então não era golo -
era poema
Um abraço Flora!